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Dia NÃO! aos maus tratos a crianças e jovens

No mês de abril, dedicado à Prevenção dos Maus Tratos na Infância e Juventude, a Unidade Local de Saúde (ULS) do Nordeste lembra que "a melhor forma de combater o problema é impedir qiue ele aconteça"!
Por isso, diga NÃO! a qualquer abuso físico, emocional, sexual ou forma de negligência sobre crianças e jovens.
Esta é uma missão da ULS Nordeste e um dever de toda a comunidade!
Fale connosco: Contacte o Núcleo de Apoio a Crianças e Jovens em Risco do seu Centro de Saúde!

As Autarquias Locais no eclodir do 25 de Abril de 1974

A situação vivida nas autarquias locais não se encontra na origem ou causas directas do 25 de Abril, e embora, no plano doutrinário, fosse frequentemente contestado o sistema do poder local estabelecido pela Constituição de 1933, e pelo Código Administrativo de 1936-40, a verdade é que não havia nenhum movimento organizado para o corrigir, muito menos para o substituir. No entanto, é provável que uma das causas profundas do descontentamento popular (que tornou natural a revolução) fosse exactamente a falta de autenticidade das autarquias.
No eclodir do 25 de Abril de 1974, o MDP/CDE, integrando militantes conhecidos da oposição à ditadura e estendendo-se a todo o País, ocupava uma posição privilegiada para assumir o poder local, muitas vezes com a colaboração de representantes das Forças Armadas, tendo mesmo como que se auto-constituído como estrutura representativa de toda a oposição e foi, nessa qualidade que, desde o dia seguinte, dialogou com a Junta de Salvação Nacional e com o Movimento das Forças Armadas.
Seria o 1.º de Maio a marcar o começo da tomada do poder local pelas forças da oposição, dirigidas em particular pelo Partido Comunista. A ocupação de muitas câmaras municipais e juntas de freguesia demonstra que houve o aproveitamento da mobilização popular, conseguida naquele dia, para se iniciar o assalto ao poder local, por parte de forças políticas reunidas à volta do MDP/CDE, que agrupava representantes informais do PCP, do PS e muitos independentes.
Os jornais da época relatam diversas acções levadas a cabo de norte a sul do país durante aquele dia, onde se referem decisões respeitantes às autarquias locais, em que de forma geral se dá conta da demissão dos corpos gerentes e na sua substituição por comissões administrativas.
Enquanto os partidos se organizavam, o espírito frentista e unitário do PCP manteve e estimulou o MDP/CDE para, através deste, exercer funções e nomear pessoas e individualidades que não podiam ou não queriam ser conotadas com o PCP, e a manutenção desse apoio e o seu controlo efectivo sobre as suas estruturas permitiram aos comunistas a conquista de posições-chave, quer nos municípios, quer em organismos oficiais e na administração pública.
Os meses de Junho e de Julho seriam marcados por inúmeras exonerações e dissoluções formais das autarquias locais, ao longo de todo o país, originando as primeiras divergências entre o Partido Socialista e o PCP em torno do papel do MDP/CDE, que ocupara importantes posições nas autarquias. O PS chega mesmo a propor, e posteriormente o PPD, sem êxito, a realização de eleições antecipadas em Outubro de 1974 para as autarquias locais, a fim de neutralizar a influência do MDP/CDE. 
No final de 1974, pode afirmar-se que todas as autarquias estavam “saneadas”, isto é, delas tinham sido afastadas individualidades conotadas com a ditadura, particularmente aquelas que se não apressaram, como ocorreu em muitos casos, a aplaudir o MFA e a revolução.
De facto, quando à popularidade local das anteriores autoridades administrativas se juntou a sua própria profissão de fé nos ideais democráticos e revolucionários do 25 de Abril foi difícil, e algumas vezes impossível, ao MDP/CDE, ao PCP e ao PS forçarem a substituição dessas mesmas autoridades.
Repetiu-se, em muitos casos aquele “fenómeno” político e social que, quando da queda da Monarquia, em 1910, ficou designado como “adesivagem”.
Quando se realizaram as eleições para a Assembleia Constituinte, em 25 de Abril de 1975, estava consumada não apenas a ruptura com o corporativismo no plano das estruturas do poder local como havia já a experiência política e social acumulada para definir um novo quadro jurídico para novas autarquias, reclamada por todos os partidos e pelas populações.
As duas ideias de força reivindicadas, isto é, a restauração descentralizadora da tradição municipalista portuguesa e a autonomia das autarquias locais, de facto, teriam acolhimento no quadro da elaboração da nova Constituição de 1976.

* Historiador
 

Da filosofia e da política

A reflexão filosófica conduz-nos a uma aventura fascinante do devir do pensamento e a um percurso ímpar que vai da família, à aldeia e à cidade. Paulatinamente o mito vai dando lugar à filosofia e à política. Platão fala-nos da cidade ideal. Aristóteles vai alicerçar a génese da filosofia política no poder paternal da família. Várias famílias dão origemA a uma estrutura mais complexa que é a aldeia. Por seu lado as aldeias dão origem à cidade, à “polis” de grande complexidade que já exige um poder político que tende ao bem comum. E assim, com Aristóteles há uma importante sistematização da política como ciência, partindo dos seguintes pressupostos: “Primeiro, procuraremos rever o que foi dito pelos nossos predecessores que investigaram este assunto. Depois, com base na nossa recolha de constituições, consideraremos o que preserva e o que destrói as cidades bem como as respetivas constituições e quais são as causas de que umas sejam bem governadas e outras não. Estudadas estas questões, podemos compreender melhor qual a melhor constituição, como cada uma deve ser ordenada e de que leis e costumes carece.”
E é por isso que cada vez mais me fascina a política enquanto repositório de saberes antiquíssimos que o devir humano vai completando, vai aperfeiçoando, no sentido de tornar a ação política numa prática tendente ao bem comum e ao bom governo da cidade.
Isto é política, a mais nobre ação humana e de novo ouvimos o grego Aristóteles: “o homem é, por natureza, um animal político.” 
Regressando aos nossos dias e à nossa ação política, facilmente se confunde política, com política partidária que sem dúvida é essencial para garantir a democracia, entendendo que, como diz Winston Churchill: “A democracia é a pior forma de governo, à exceção de todos os outros já experimentados ao longo da história.” E infelizmente a história está cheia de maus exemplos do aproveitamento político-partidário. Todos nos lembramos, horrorizados, como o Cabo Hitler chegou a líder do Partido dos Trabalhadores Nacional-Socialistas Alemães e mais tarde acumulou os cargos de chanceler e presidente dando origem à criação do “Terceiro Reich”, da polícia secreta “Guestapo” e ao extermínio desumano, entre outos, de milhares de judeus, ciganos e opositores. “Se existe um Deus, ele terá que implorar pelo meu perdão.” Foi esta a frase escrita na cela por um prisioneiro judeu. Horrores em nome da política.
Claro que hoje a política partidária, aparentemente, no nosso meio, é mais civilizada, mais afetiva, mais pluralista, embora seja no seio dos partidos que muitas vezes renascem os antigos tiranos que facilmente quebram o verniz: Quem não é por mim é contra mim. E assim, fiéis seguidores vão catapultando, numa dinâmica de clubismo, políticos que não estudam e exibem qualificações e títulos que não possuem.
É por isso que dentro do espírito da velha máxima atribuída a Sócrates, o grego: “só sei que nada sei”, continuo a estudar a ciência política com devoção. Participo na vida partidária em liberdade. Aprendi o máximo que pude com os meus antecessores, a quem respeito e venero. Ensino humildemente os mais jovens. Leio Platão e Aristóteles, pioneiros do pensamento político e acredito, convictamente, que a política é o dom maior do homem ético que tende à felicidade.

O AUTO PROCLAMADO ESTADO do INTERIOR 2 (continuação)

Penso que os Transmontanos não se revêem na recomendação Salazarista de que “os pobres devem saber ser pobres” mas também não os vejo, de forma alguma, na postura de “chulecos” valendo-se de expedientes tácticos para ir buscar mais “algum”. Também não os vejo como os “moderados” do Maio de 68 que aconselhavam “Sede realistas! Pedi o impossível!” Mas ainda os vejo menos como uns parolos reconhecidos com o estatuto de burro ou de vaca Mirandesa com que o “Movimento pelo Interior” os quer brindar quando vaticina que “sem subsídio não ides lá”. Os Transmontanos são orgulhosos demais para aceitarem esmolas mas também são suficientemente humildes para aceitarem, como bem vinda, qualquer ajuda quando sozinhos não logram alcançar. Não aceitamos qualquer estatuto de excepção ou de privilégio  pois seria o reconhecimento da nossa incapacidade, da nossa incompetência. ( “Não queremos o peixe mas queremos que nos ensinem a pescar”). Somos como somos, temos o que temos mas temos, sobretudo, a obrigação de o saber rentabilizar. E para rentabilizar as nossas potencialidades não nos envergonhamos de pedir às “cabeças iluminadas” (espero que por Deus que não, só, pela luz elétrica - O. Salazar) ajuda para remover dificuldades. Darei alguns exemplos de empreendimentos que teimam em não se realizar pela falta de conjugação de esforços e que poderá ser um teste às capacidades dessas figuras públicas. Assim queiram elas.
1- Não temos uma estrutura agro-industrial desde que o Cachão fechou. Como se sabe a falta de estruturas de recolha da produção agrícola leva ao abandono da produção. Claro que a transformação deve ser o passo a seguir à produção. Só que, se além falhámos, aqui falhamos mais. Este falhanço ganha especial relevância quando falamos na castanha. Vêmo-la ir sem lhe tirar o sumo. Não resisto a relatar o que vi e ouvi numa feira de produtos da terra que a televisão transmitiu. Foi assim: dois empresários italianos do ramo da castanha, com fortes negócios aqui no Nordeste, exibiam um pacote de “bombons” de castanha, o mais recente produto das suas indústrias transformadoras. Quando o entrevistador televisivo lhes perguntou onde poderia comprar um pacote desses “bombons”, responderam “ não, para já é só para Itália”. Fiquei indignado mas também envergonhado. Indignado por ver a arrogância daqueles italianos que levam daqui a matéria prima e sem o mínimo de elegância dizem-nos, na cara, que o produto acabado não é para indígenas. Mas também fiquei envergonhado porque quem tinha obrigação de fazer aqueles bombons eramos nós. Eu sei que os não sabemos fazer mas podemos ir buscar quem saiba. O Eng. Camilo de Mendonça para fazer as compotas no Cachão também foi buscar Mestres ao estrangeiro.
2- A falta de dimensão das explorações agrícolas não permite uma mecanização eficiente o que aliada à falta de escala trás produtividades abaixo do sofrível. Sem competitividade logo com baixos salários, o abandono da actividade é a saída. O emparcelamento, não sendo panaceia, daria outro fôlego ao sector. Mas o emparcelamento não é coisa que nós possamos fazer, isso é coisa da política. Ora, é mesmo à política que nós devemos este atraso ancestral, esta política de minifúndio, esta agricultura de canteiro. A falta do emparcelamento, logo a falta de dimensão, acarretou a falta de investimento na agricultura, a manutenção do paradigma agrícola, em suma o atavismo. Mas os políticos sempre  tiveram medo ao emparcelamento. Acho que já é altura de sacudir esses receios e para isso contamos com a prestimosa colaboração dos nossos “chefes de turma”.
Por outro lado, os nossos baldios, excluindo a parte alocada às Matas Nacionais, não produzem rigorosamente nada. E não se pense que é despiciendo pois Bragança mais Vila Real têm aproximadamente 120.000 hectares de baldios. Ponham esses hectares nas mãos de quem sabe e os quer trabalhar. Mas isso também não é tarefa nossa, é da Política. Aceitamos ajuda.
3- Trás-os-Montes recebeu uma prenda de luxo e não sabe o que há-de fazer com ela. Trata-se de 100 km de zona ribeirinha na albufeira do baixo Sabor. A albufeira, com 50 km de comprido, é um espelho de água imenso onde se pode fazer pesca, caça, mergulho, sky aquático, náutica de recreio, motonáutica de competição isto tudo contando com o apoio logístico dos bares, das praias, dos restaurantes, dos parques de campismo, etc. É estranho que, sendo mais ou menos consensual a ideia que o turismo é uma das poucas hipóteses de desenvolvimento sustentado que temos, ninguém mexa uma palha.
4- Moncorvo tem sido muito falado pela hipótese de reabertura das minas de ferro. Os jornais trouxeram escalpelizado o assunto do escoamento do minério para a siderurgia do Seixal. Vantagens e inconvenientes do escoamento por rodovia, pela via fluvial ou pela ferrovia. Por fim assentaram que o escoamento se fará por rodovia até Vila Franca das Naves e daí seguirá por ferrovia até ao Seixal. Ora, o que me faz confusão é terem estudado até à exaustão o escoamento do minério para a siderurgia do Seixal e nem uma linha, nem um pensamento sequer, sobre a possibilidade de trazer a siderurgia para Moncorvo apesar das imensas vantagens que isso traria para a região. Nem aos autarcas, sempre tão zelosos dos interesses dos seus municípios, lhes ouvi aflorar essa hipótese. E não é novidade nem deve ser difícil. Não é novidade pois em tempos houve os altos fornos da Campeã-Vila Real que era onde descarregava o minério de ferro de Guadramil. Além disso se se pensa que a deslocalização da siderurgia é “um bicho de sete cabeças” eu lembro que o dono da siderurgia, há um ano ou dois, ameaçou mudá-la para Vigo se lhe não fizessem um determinado preço na electricidade. É porque não deve ser muito difícil.                                                                                                                        
5- A mobilidade em automóvel com propulsão eléctrica será, dizem, a 4ª revolução industrial. A peça fundamental desse veículo é a bateria de lítio. Ora, segundo a empresa mineira Dakota Minerals, Portugal possui em Montalegre, na Serra de Arga e Barca de Alba as maiores reservas de Lítio da Europa. Isto devia ser motivo bastante para que as Câmaras, os Politécnicos, as Universidades instituíssem prémios, criassem bolsas de estudo, contratassem Professores e peritos estrangeiros, enfim, que de uma forma ou outra fomentassem a investigação na aplicação do Lítio às baterias. É absolutamente fundamental que quando o Lítio sair da mina haja pessoal especializado de maneira a prosseguir os procedimentos que constituiriam a fileira do Lítio. Em suma: da mina à bateria seria tudo trabalho nosso com a arrecadação das respectivas mais valias para não falar na colocação de mão de obra especializada no interior. Que não aconteça ao Lítio o que aconteceu à castanha. Seria demasiado mau.
Pelos vistos, algumas nozes, ainda, há. Temos de compor os dentes.

O ónus dos livros e da leitura na autognose humana

“Os livros são o alimento da juventude”, Cícero.
“A leitura engrandece a alma”, Voltaire.

Esta sucinta reflexão é motivada pela efeméride comemorada no dia 23 de abril, assinalando-se o Dia Mundial do Livro e dos Diretos de Autor.
As palavras, sempre atuais, dos mestres citados nas epígrafes encerram o desígnio deste texto, isto é, o encómio da leitura. No entanto, convém contextualizar e recentrar a questão nos tempos hodiernos.
Começo por uma interrogação, que razões nos levam, no presente, a ler? As causas são inúmeras, para não ser exaustivo, elenco apenas: lemos, fundamentalmente, por uma necessidade de libertação e para expressar o nosso inconformismo que não deve aceitar ficar aprisionado dentro dos limites de ideários pré-estabelecidos e de um vocabulário primário. Este progressivamente cada vez mais reduzido por razões demagógicas dos aparelhos de condicionamento das mentalidades e dos media, que se têm esforçado por o afunilar, reduzindo-o a uma elementaridade básica, que não se coaduna com as reais necessidades dos seres pensantes.
Reconheço, a contragosto, que as intervenções que se fazem, coadjuvadas pela propaganda, abrem caminho à custa do abandono da literatura no ensino, por um lado, e pela sua desvalorização nos media, por outro. Por vezes, fico com a sensação de que para os poderes instituídos, tanto a nível nacional como internacional, patentes e latentes, como nos tempos da ditadura salazarista, de má memória, basta que as pessoas sejam capazes de ler, escrever e contar. Estes intentos fazem eco das palavras, infelizmente não anacrónicas, de D. Miguel Forjaz, da obra “Felizmente Há luar!” de Luís Sttau Monteiro: “sonho com um Portugal próspero e feliz, com um povo simples, bom e confiante, que viva lavrando e defendendo a terra, com os olhos postos no Senhor.” Em suma, estas atuações mais não pretendem do que suprimir toda a complexidade, limitando escolhas e tranquilizando espíritos, com o fito de instituir o conformismo, a uniformização e a resignação, de forma acéfala, ao paradigma que se impõe.
Perante este cenário caótico e disfórico, só nos resta uma atitude digna de seres racionais, encarar o livro como um objeto falante, como algo que nos põe a pensar, pois já Platão afirmava que: “o livro é um mestre que fala, mas que não responde”. Essa tarefa cabe, inequivocamente, ao leitor, mas pensar é a coisa mais difícil que o homem pode fazer, como se infere dos versos de Pessoa/Caeiro: “Pensar incomoda como andar à chuva / Quando o vento cresce e parece que chove mais”. O livro é, sem dúvida, um objeto para pensar. Se o livro não cumprir esse desiderato, quem realizará esse encargo? A televisão? Não me parece. Esta, respondendo a interesses ínvios, está apostada em criar cidadãos acríticos que consumam a panóplia de programas, bens e serviços publicitados até à extenuação e, não raras vezes, à náusea.  A este propósito, recordo os versos: “putos que crescem sem se ver / basta pô-los em frente à televisão”, da música, de 1992, “Chuva dissolvente”, dos Xutos & Pontapés, que já, na derradeira década do século XX, alertava para as perniciosidades de uma educação baseada nos curricula da “caixa mágica”, assumindo-se, no presente, como uma enxurrada de irrealidade extraordinária.
Voltando ao livro e às razões da leitura, pergunto por que devemos ler? Lemos para ter lucidez e utilizar esse conhecimento em prol dos outros, isto é, da sociedade.
Assim sendo, impõe-se nova questão. Que relação devemos ter com a leitura? Do rol de réplicas possíveis - cf. Daniel Pennac Como um romance - apresenta-se esta. A relação com o objeto livro deve ser violenta. Devemos encarar a leitura como uma dura peleja entre as ideias do livro/autor e o pensamento do leitor, sendo essa pugna renovada a cada nova leitura. O mesmo se infere das palavras de Italo Calvino, em Porquê Ler os Clássicos: “Interessa-me muito tudo o que Jean-Jacques Rousseau pensa e faz, mas tudo me inspira um irresistível desejo de contradizê-lo, de criticá-lo, de brigar com ele”. Da contenda podemos, por vezes, sair a coxear e a ver menos, isto é, mais confusos; mas, na maioria das vezes, ficamos a enxergar mais e de forma diferente, ou seja, os nossos horizontes podem abrir-se até ao infinito.
Sintetizando, devemos cultivar a insubordinação do pensamento e adotar como estandarte/divisa a insolente liberdade de pensar. Só, assim, escaparemos à pesada sentença de Eugénio de Andrade, presente nestes versos, escritos em 1948, mas que se mantêm atuais, pese embora o caminho percorrido, em 2018: “Passamos pelas coisas sem as ver, / gastos, como animais envelhecidos: / se alguém chama por nós não respondemos, / se alguém nos pede amor não estremecemos, / como frutos de sombra sem sabor, / vamos caindo ao chão, apodrecidos”.
Termino reiterando não só a importância da leitura, mas, sobretudo, uma certa maneira de ler, encarada como um combate, que nos permite conhecer as ideias que o livro explana, honrando, desta forma, o autor e a obra; porque os livros são, indubitavelmente, os objetos mais propícios à autognose, como asseverou Marguerite Yourcenar, escritora belga, primeira mulher eleita para a Academia Francesa de Letras, em 1980, no livro Memórias de Adriano: “o verdadeiro lugar do nascimento é aquele em que, pela primeira vez, se lança um olhar inteligente a si mesmo: as minhas primeiras pátrias foram os livros. Num grau inferior, as escolas”.
O valor da leitura e dos livros é, também, destacado por Italo Calvino, na obra citada, ao afirmar: “A escola destina-se a dar-nos instrumentos para exercermos uma opção; mas as opções que contam são as que se verificam fora e depois de todas as escolas”.
Epilogando, a melhor forma de celebrar o Dia Mundial do Livro e dos Diretos de Autor é, sem dúvida, ler as obras e questionar as ideias nelas plasmadas. Assim, os livros granjearão vida e os leitores concretizarão a autognose almejada, pois, como escreveu Stéphane Mallarmé, em 1897, “Todo o Pensamento produz um Lance de Dados”.