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Mary Alberthina

Bom dia, forte gente. Como vai essa saúde? Que estas palavras vos encontrem bem! Com o tempo criamos uma relação próxima, nós que nunca nos vimos, mas é como se nos conhecêssemos
há anos. Esta interessante interação que se estabelece entre emissor e receptor através de palavras impressas na folha de um jornal, uma coisa muito século dezanove ou vinte, é verdade,
mas que ainda vai valendo.
Se bem que hoje em dia este tipo de comunicação resulta melhor quando acompanhada de uma caixa de comentários para se poder mandar o emissor às favas, os outros leitores às favas e tudo às favas, em geral, dando azo ao que de mais original e interessante tem o ser humano para anunciar ao mundo quando se expressa sem ter de dar a cara ou revelar a identidade.
A liberdade de expressão é democrática, a liberdade de anónima expressão tende a ser vil e coprológica. Ou, em caixa-de-comentarês, javarda e badalhoca. Quem somos nós, cidadãos, quando comunicamos ocultos sem rosto ou nome? A fronteira entre sermos bons ou maus selvagens reside em revelar a identidade? Ficam os tópicos e os adjetivos para análise numa outra tertúlia mais demorada, porque hoje venho falar de nomes. Os nomes com que registamos as nossas identidades. 
Recentemente tenho reparado que a novas gerações de pais portugueses têm dado nomes meio esquisitos ou, na verdade, modernos aos filhos.  Vocês já sabem que a minha perspectiva do país é traçada a distância, filtrada pelas notícias que vão chegando através do meios online. Em relação a nomes, eu próprio nasci numa oitava década tomada por Carinas, Brunos e Brunas,  Cátias e Raquéis, Yuris e Vladimires.
O habitual Maria vai bem com tudo dera então lugar ao Ana mais tudo e alguma coisa: Ana Rita, Ana Rute, Ana Paula, etc. Sem esquecer as Vanessas, claro está, como tão perspicazmente registou o nosso saudoso António Variações. Eu que me chamo Manuel, nesses anos de baby boom dos nomes em Portugal, eu tinha nome de velho, de avô. Agora, nesta roda do tempo, voltou a estar na moda, volta a haver Manuéis com fartura. Os clássicos convivem com os Nohas e os Kevins, as Kellys e as Cloés. Estes nomes da atualidade que alguns pais portugueses colocam os
filhos inserem-se num âmbito sociologicamente interessante. Primeiro há os nomes que não são portugueses como Giovana,  Enzo ou Lorenzo. Os nomes de origem italiana sempre tiveram muita saída entre nós, talvez como predição para atrair Ferraris e Lamborghinis. O espírito revolucionário de inspiração soviética dos anos 80 deu lugar à universalidade das popstars, principalmente da área da música e do desporto. Estes nomes estrangeiros, apesar de ambos os pais serem portugueses, revelam uma curiosa internacionalização do produto, uma questão de marketing, uma criança a despontar desde já para um mundo global, comercial e desprovido de fronteiras mesmo que o indivíduo internacionalmente nomeado venha a desenrolar toda a sua vida entre Lisboa e o Barreiro. Como num “estou além”, do referido grande mestre, são nomes que já estão onde não estão, que querem ir para onde ainda não foram, no fundo, são nomes que estão mortinhos por ir daqui para fora. Portugal torna-se pequenino para nomes tão estridentes. Em segundo lugar, outro fenómeno além dos novos nomes estrangeiros, são os nomes levemente retocados. Não são nomes não-portugueses, mas antes nomes portugueses atualizados. Já vi Mathilde e Thiago com ‘th’, ou Sebastian e Christian, estes entre o estrangeiro e o português melhorado.
São nomes que não trazem maquilhagem, mas sim make up. Pensem na quantidade de vezes que estes pais e filhos vão ter de dizer «é com th» ao longo da vida. «Não, é Mathias, mas com th». E é neste «é com th» que para muitos pode ser visto como um aileron num Citroen Saxo ou umas jantes especiais num Opel Corsa dos anos 90, que reside, para os pais, o brilho,
a estrelinha, a diferença.
Portugal é um lugar cheio de pequenas e aprazíveis surpresas como esta, sobretudo, se apreciadas com o vagar de um mirone de mãos nos bolsos que não tem mais nada para fazer a não ser ver o mundo passar-lhe à frente do nariz. E com isto assumo uma certa costela de velho do Restelo, o tipo de costelas que teimam em despontar com a idade, como involuntária reação às “novas qualidades e novidades que o mundo vai tomando”. O que agora causa uma certa estranheza será amanhã a norma. Afinal, os nossos nomes próprios às vezes dizem de onde vimos, mas pouco dizem de quem somos, são antes de mais carne para bilhete de identidade. Na China é outra história, a escolha do nome próprio é todo um destino, um significado profundo, um diálogo entre o ancestral e o provir, reflete-se com a família, consultam-se especialistas, o nome próprio cunha a personalidade, dizem. Se for mar ou chuva, significa uma coisa porque são  elementos da água; lua ou estrela já remetem para outras celestes características. Os chineses têm normalmente dois ou três nomes. O último ou os dois últimos são os próprios, o primeiro é o  de família. Faz-se sempre tudo do geral para o particular. A individualidade fica sempre para último, primeiro o coletivo. O primeiro nome, o de família (só há lugar para um) é o do lado paterno, algo que as mulheres começam a lamentar. Já há casos pontuais em que os casais escolhem o nome da família da mulher, mas geralmente o lado das mulheres desaparece nos meandros varonis dos apelidos.
Nomes e sobrenomes têm muito para contar. Caro leitor e amigo sem nome, tenha uma excelente semana com muita saúde. Um forte abraço!

Geração baralhada

Se conhecem alguns, certamente não lhes escapou despercebida esta situação inquietante: os nossos jovens não estão bem. Todos os estudos mostram que os jovens com menos de 30 anos, pelo menos uma grande parte deles, são as primeiras vítimas da agravação das desigualdades a partir da pandemia de ovid. No ensino superior essencialmente, torna-se cada vez mais difícil fazer um percurso coerente, com aulas e seminários que saltam, com intermináveis túneis de aulas em videoconferência, com exames mais ou menos assegurados e a ausência de qualquer
atividade coletiva. Stress, ansiedade, depressão, solidão: há mais dum ano que o ensino superior vem alertando para a saúde psíquica dos estudantes. No que diz respeito aos que estão no mercado de trabalho, a situação não para de se degradar; entre a dificuldade de inserção profissional, precarização dos empregos e disparidade das desigualdades. Nas empresas, se contratar era difícil, é-o agora ainda mais.

Os estágios e os contratos a termo, que permitiam adquirir uma primeira experiência tornaram-se raros, as empresas cada vez menos inclinadas a aumentar os seus efetivos pois a pandemia
de covid complica especialmente a gestão dos recursos humanos … Além do desaparecimento dos pequenos empregos na restauração, entre outros, algo que foi desastroso para estes jovens.
Salários muito baixos, contratos precários e altas taxas de desemprego: hoje, mais dum jovem em dez encontra-se em situação de pobreza… As consequências são inúmeras: mal alojados,
isolamento social e, também aqui, repercussão na saúde psíquica. Safam-se alguns que podem contar com uma família sólida, presente, unida. E os outros?

Os sociólogos falam duma “geração covid”, baralhada e inquieta, para caraterizar estes estudantes ou estes jovens ativos cujos projetos foram claramente imobilizados pelas restrições ligadas
à crise sanitária.

Por fim, temos também o teletrabalho. Não é intenção contestar aqui as medidas tomadas ainda hoje que visam travar a circulação do vírus, mas, mesmo neste campo as principais vítimas
são os jovens trabalhadores. Isolados muitas vezes, porque são solteiros na sua grande parte, têm de passar oito horas sozinhos frente ao ecrã, e por vezes só lhes resta regressar a casa
dos pais para não se encontrarem esmagados pela solidão. As empresas não deveriam apressar-se a este ponto no desejo de querer generalizar o famoso teletrabalho,
com o pretexto de favorecer a flexibilidade - suave eufemismo para poderem  ganhar as despesas fixas - de superfície afixada e de produtividade. Porque, que geração de novos
assalariados estamos nós a fabricar? Que espírito de empresa pretendemos favorecer quando se toma o hábito de ziguezaguear nos open-spaces meio cheios?
Com é possível formar uma comunidade de indivíduos a partir dum projeto quando se ignora tudo a partir daqueles com quem é suposto trabalhar?
Gostaríamos de lhes mostrar o significado de tudo isto, que a única coisa que interessa, é a sua força de trabalho, que a relação e a colaboração com o outro
não passam duma perda de tempo, que tudo não pode ser visto doutra forma.
Nada espanta em relação ao que estamos a assistir, com muitos dos jovens em questão, seja pondo em causa a sua orientação profissional, seja as suas opções de
vida remetidas para a sua satisfação individual, o trabalho não passando assim duma variável de ajustamento.
Fala-se de esforços do governo em relação a estes jovens em grandes dificuldades. Mas não deve ser unicamente o governo.
Neste momento em que se fala de “empresa cidadã”, não podemos esquecer que o trabalho, a empresa é um lugar de socialização. E que também é seu dever preparar as novas gerações para
os compromissos do futuro.